“ESTUDOS SOBRE A PALAVRA DE DEUS” - HEBREUS 4

“ESTUDOS SOBRE A PALAVRA DE DEUS”

Tradução de Synopsis of the Books of the Bible – John Nelson Darby

Em seguida o apóstolo, aplicando esta parte da História de Israel àqueles a quem escreve, põe em evidência dois pontos:

Em primeiro lugar, Israel tinha sido privado, devido à sua incredulidade, de entrar no descanso; em segundo lugar, o descanso era ainda futuro, e os crentes (aqueles que não procuravam o descanso neste mundo, aceitando o deserto para o tempo presente) deviam ali entrar.

Começa, dizendo:


"Temamos... sendo-nos deixada a promessa de entrar no descanso de Deus, suceda parece que algum de vós fique para trás"; porque Deus nos anunciou boas notícias, como tinha feito outrora a Israel. Ora, a Palavra que lhes foi dirigida ficará sem fruto, se não for misturada com fé naqueles que a ouviram; porque nós, os que cremos, entraremos no descanso. O próprio descanso é ainda futuro, e são os crentes que ali entram; porque há um descanso de Deus e alguns entram nele. Com efeito, Deus disse: "Eles não entrarão no meu descanso!" (quer dizer, aqueles, designando assim uma certa classe de indivíduos que deve ser dali excluída).

Deus trabalhou quando da Criação; depois descansou das Suas obras, quando estas foram concluídas. Por conseguinte, depois da fundação do mundo, Ele mostrou que havia um descanso para Si, como nos é dito na passagem supracitada:

"Eles não entrarão no meu descanso!" Mas isto, fazendo ver que a entrada estava ainda em questão, demonstrava que o homem não tinha ·entrado no descanso de Deus, quando da primeira Criação. Duas coisas se tomam, pois, evidentes: Primeira, alguns devem entrar no descanso; segunda, Israel, a quem esse descanso foi, de início, proposto, não entrou ali por causa da sua incredulidade. E por isso que Ele fixa ainda um dia, dizendo por Davi, muito tempo depois da entrada em Canaã: "Hoje", como está escrito, "se ouvirdes a Sua voz, não endureçais os vossos corações".

Aqui uma objeção natural se apresenta, à qual o apóstolo dá uma resposta adequada e completa, sem contudo falar na própria objeção. Os Israelitas tinham caído no deserto; mas Josué tinha introduzido o povo em Canaã, aonde os incrédulos não tinham chegado. Os Judeus encontravam-se ali, de sorte que tinham entrado no descanso que os outros não tinham alcançado. A resposta a esta objeção é muito simples: Foi muito tempo depois que Deus disse, por intermédio de Davi: "Jurei na minha ira: Não entrarão no meu descanso!" Se Josué tivesse dado o descanso a Israel, Davi não teria podido falar, depois disso, de um outro dia. Resta, pois, um descanso sabático para o povo de Deus. Esse descanso é ainda futuro, mas está ­nos assegurado pela Palavra de Deus; verdade cujo alcance se compreende imediatamente quanto às relações dos Judeus crentes com o povo, no meio do qual eles se viam tentados a procurarem um descanso que a fé, de momento, não dava, e que, em razão do seu enfraquecimento, não entrevia no futuro senão muito vagamente. Para termos o descanso de Deus é necessário perseverar na fé. O aparente descanso de então não era o verdadeiro descanso. O descanso de Deus ainda se fazia esperar; só a fé o reconhecia, e, não procurando descanso no deserto, apoiava-se na promessa. Deus ainda dizia: "Hoje".

O estado do povo era pior do que o descanso em que Josué o tinha introduzido, descanso esse que não era como os Salmos dos Judeus o indicavam.

Quanto à ordem dos versos, a exortação do verso 11 depende do conjunto precedente, de harmonia com o raciocínio completado pelo testemunhado de Davi, vindo após Josué. Terminada a Criação, Deus descansou, é verdade; mas depois disso Ele disse: "Eles não entrarão no meu descanso!", de sorte que os homens não entraram nesse descanso. Josué entrou na Terra Prometida, mas a Palavra vinda por meio de Davi, muito tempo depois, prova que o descanso de Deus não fora ainda alcançado. Todavia, esse mesmo testemunho que proibia a entrada no descanso, por causa da incredulidade, mostra que alguns devem ali entrar, sem o que não teria havido necessidade de falar na exclusão de alguns, por uma razão especial, nem de advertir os outros de que poderiam escapar àquilo que os impedia de ali entrarem. Não há aqui necessidade de nenhum parênteses.

Ora, enquanto alguém não cessa o seu trabalho, não entra no descanso. Aquele que ali entrou, cessou de trabalhar, tal como Deus repousou das suas obras, para entrar no Seu descanso.
"Esforcemo-nos, pois", diz a exortação da fiel testemunha de I Deus, "por entrarmos naquele descanso" - o descanso de Deus ­para que não caíamos em imitar uma semelhante desobediência.

Note-se bem aqui que se trata do descanso de Deus. E o que nos faz compreender a felicidade e a perfeição desse descanso. Deus deve descansar naquilo que satisfaz o Seu coração. Foi o que se deu quando da Criação: "Tudo era muito bom!" E' agora o Seu perfeito amor não poderia ficar satisfeito, quanto a nós, se não nos introduzisse numa bênção perfeita; possuiremos uma porção celestial na bênção que teremos na Sua própria presença, em luz e santidade perfeitas. Por isso, todo o penoso trabalho da fé, o seu exercício no deserto, o combate (embora ali tenha também muitas alegrias), as boas obras que ali se fazem e todo e qualquer esforço cessarão. Não se trata apenas de ficarmos livres do pecado interior, pois todo o trabalho e todos os sofrimentos do novo homem chegarão ao fim. Nós estamos já livres da lei do pecado; então, os nossos exercícios espirituais para Deus cessarão. Descansaremos das nossas obras - não das más! Já descansamos delas, pelo que concerne à justificação, e, por conseguinte, nesse sentido, temos o descanso na nossa consciência; mas não se trata aqui disso. Trata-­se, sim, do descanso do Cristão quanto a todos os seus trabalhos. Deus descansou das Suas obras, que eram, evidentemente, boas obras e nós também descansaremos então com Ele.

Agora estamos no deserto; também combatemos contra os poderes espirituais da maldade que estão nos lugares celestes. Resta-nos um descanso precioso. O nosso coração descansará junto de Deus. Ali nada perturbará a perfeição do nosso descanso. Deus descansará na perfeição da bênção que tiver concedido ao Seu povo.

O grande pensamento da passagem é que resta um descanso (quer dizer que o crente não deve esperar o descanso neste mundo), sem que nos seja dito onde; e a epístola não nos fala em pormenor acerca do caráter do descanso, porque deixa a porta aberta a um descanso terrestre, na base das promessas para o povo terrestre; embora para os Cristãos, participantes da chamada celestial, o descanso de Deus seja, evidentemente, celeste.

Este capítulo apresenta-nos em seguida o instrumento que Deus emprega para julgar a incredulidade e todos os movimentos do coração que tendem, como temos visto, a levar o crente a abandonar a sua posição de fé, a ocultar-lhe Deus, satisfazendo antes a sua carne, e a procurar repouso no deserto.

Este Julgamento é muito precioso para o crente que é reto de coração; tem por efeito torná­-lo capaz de descobrir tudo o que tende a detê-lo no seu caminho, ou a retardar-lhe os passos. A Palavra de Deus, revelação de Deus, expressão do que Deus é, de tudo o que O rodeia e do que Ele quer, no meio de todas as circunstâncias em que nos encontramos, julga tudo o que, no coração do homem, não é de Deus. Ela é mais penetrante do que uma espada de dois gumes. Viva e enérgica, ela separa tudo o que mais intimamente está ligado e confundido nos nossos corações e nos nossos pensamentos. Onde a natureza (alma e os seus sentimentos) se mistura com o que é profundamente espiritual, a Palavra de Deus coloca entre ambos, como o fio de uma espada, a verdade viva de Deus, e julga os movimentos ocultos do coração a tal respeito. Ela discerne todos os nossos pensamentos e as respectivas intenções. Mas tem ainda um outro caráter, como vinda de Deus: Ela é como um olhar penetrante, sobre a nossa consciência; põe-nos na presença de Deus com tudo o que ela nos força a descobrir. Ela coloca, pois, a nossa consciência sob o penetrante olhar do próprio Deus. Nada há oculto; tudo está manifesto aos olhos d'Aquele com quem temos de tratar (1).

Tal é o verdadeiro socorro, o poderoso instrumento de Deus para julgar em nós tudo o que nos impediria de continuarmos alegremente, com um coração fortificado pela fé e pela confiança em Deus, a nossa caminhada através do deserto. Precioso instrumento· de um Deus fiel! Sério e solene na sua operação, mas de uma bênção inapreciável e infinita nos seus efeitos, nas suas conseqüências! É um instrumento que, na sua operação, não deixa "as vontades da carne e dos pensamentos" livres de atuarem, não permite ao coração enganar-­se, e dá-nos força, colocando-­nos, sem impedimento, na presença de Deus, para continuarmos o nosso caminho com alegria e energia espiritual.

Termina aqui a exortação que se baseia no poder da Palavra de Deus.

Mas há um outro socorro, socorro de um outro caráter, para nos ajudar na travessia do deserto:
É o Sacerdócio, assunto iniciado aqui e que prossegue nos capítulos seguintes.

Nós temos um Sumo Sacerdote que atravessou os céus - como Arão atravessava as partes sucessivas do Tabernáculo - Jesus, Filho de Deus.

Ele foi tentado em todas as coisas, semelhantemente a nós, à parte o pecado, de modo que pode simpatizar com as nossas enfermidades. A Palavra de Deus põe a nu as intenções do coração, julga a vontade e tudo o que não tem Deus por alvo e por origem. Depois, pelo que concerne à fraqueza, temos a simpatia de Cristo. Escusado seria dizer que Ele não teve más cobiças; foi tentado de todas as maneiras, exceto no pecado. O pecado não entrava por nada nas Suas tentações. Mas eu não desejo simpatia pelo pecado que está em mim; detesto-o. Desejo que ele seja castigado, julgado, que não seja poupado em nada - e é o que a Palavra de Deus faz. Para a minha fraqueza e para as minhas (1) A ligação da Palavra dirigida ao homem, com o próprio Deus, é aqui muito notável, dificuldades procuro a simpatia, e encontro-a no Sacerdócio de Jesus. Não é necessário que uma pessoa, para simpatizar comigo, sinta no mesmo momento que eu aquilo que eu próprio sinto; antes ) contrário: Se num dado momento eu sofrer atrozmente, não estou em condições de pensar do mesmo modo no sofrimento alheio. Mas, para simpatizar, é necessário que eu tenha uma natureza capaz de apreciar esse sofrimento.

*A ligação da Palavra dirigida ao homem, com o próprio Deus, é aqui muito notável.

Assim acontece com Jesus, no exercício do Seu Sacerdócio. Ele está, em todos os sentidos, fora do alcance da dor e da tentação. Mas é Homem, e tem não só a natureza humana que, outrora, soube o que era a dor, mas também fez, mais do que qualquer um de nós, a experiência das penas da tentação que um santo é chamado a enfrentar; e o Seu coração livre e pleno de amor pode simpatizar plenamente conosco, segundo a experiência que tomou do mal e segundo a liberdade gloriosa que agora tem para Se ocupar dos males de que nós possamos sofrer. É o que nos encoraja a aguentar firme a nossa profissão de fé, apesar das dificuldades que obstruem o nosso caminho, porque Jesus ocupa-Se dessas dificuldades segundo o conhecimento e a experiência que tem delas e segundo o poder da Sua graça.

Por conseguinte, estando ali o nosso Sumo Sacerdote, podemos ir com toda a confiança ao trono da graça, para encontrarmos misericórdia e a graça que nos é necessária em todos os tempos de aflição; a misericórdia, porque somos fracos e vacilantes; a graça necessária, porque estamos num combate que Deus reconhece.

Note-se que não é ao sumo Sacerdote que nós vamos. Fazemo-lo frequentemente, e Deus pode ter compaixão da nossa falta de inteligência; mas proceder assim é uma prova de que se não compreende inteiramente a graça. O Sacerdote, o Senhor Jesus, ocupa-Se Ele mesmo de nós, simpatiza conosco, por um lado; por outro, nós vamos diretamente ao trono da graça.

O Espírito Santo não fala aqui propriamente de queda. O pensamento de uma queda encontra-se no capítulo 2 da Primeira Epístola de João. Ali, está em relação com a comunicação com Seu Pai; aqui, está em relação com o acesso perante Deus. Aqui, trata-se de nos fortificar, de nos encorajar a perseverarmos no caminho, pelo conhecimento da simpatia que encontramos no Céu, e pela certeza de que o trono nos está sempre acessível.

 

Referências para o estudo bíblico - Um auxílio para escola dominical